05/12/2013

Mudanças

Parece-me que chegámos ao fim de uma era qualquer. Parece-me, aliás, a mim, que chegámos ao início de outra há algum tempo. Talvez tenha sido eu que não quis ver que era o fim de um tempo mais bonito que o de agora.

Lembro-me tão bem daquela cadeira rasgada, com os braços queimados do sol, borbulhando o plástico e enferrujando o metal dos pés. Lembro-me tão bem daquela cadeira. De tecido xadrez azul escuro, azul claro e branco. Lembro-me tão bem de coloca-la na posição perfeita para conseguir pousar os pés no muro sempre mal pintado. De forma a que quando saísse só restavam os braços carregados de ferrugem e os pés levando a tinta branca e laranja do muro.

E a imagem é só uma. Essa imagem descreve perfeitamente a minha infância, quase que poderia fazer-me dizer que foi uma época feliz.

É engraçada essa tendência do ser humano em dizer que tudo o que passa foi bom, porque já não volta. Engraçada essa necessidade de amarmos algo que não podemos ter. Uma viagem que na verdade foi mais destrutiva que construtiva mas que parece ter deixado as melhores memórias de uma vida. Essas ilusões quase que diárias que nos cultivam a acreditar que tudo vale apena.

Mas e se não valer? O que acontece quando percebemos que, na verdade, há muita coisa que simplesmente não vale apena? A mim custa-me. Demoro a aceitar. Demoro a acreditar, acima de tudo.

Se deixarmos de acreditar, o que acontece com o Mundo?

O que acontece com o Mundo se, de um momento para o outro, percebermos que não devíamos acreditar? Em um gesto, uma palavra, um momento, uma noite, um amor...?

Se eu me tornar nessa pessoa fria e desconfiada...o que vai acontecer com o meu Mundo?

E, por isso, chegámos a outra era. A era da mudança inevitável. Aquelas mudanças que temos de fazer mesmo quando não queremos. Especialmente se não queremos. Aquelas mudanças em que temos de mover todos os móveis em casa, encontrar pedaços de nós esquecidos de baixo do sofá, chorarmos por eles e, depois, seguir em frente de barriga cheia. Ou vazia, tanto faz. Mas seguir em frente, sempre.

E o que acontece com o Mundo? O mesmo de sempre. Ele continua a girar. Para a esquerda, para a direita. Ora gira ao contrário, ora gira no tempo e direção certa. Ora cheio de certezas, ora cheio de dúvidas.

A mudança. Essa palavra que assusta o mundo. As pessoas têm medo que as coisas mudem. Esse é o medo comum. Que o bom se transforme no mau. Que num dia de céu aberto comece a chover. Que no trabalho sejam despedidas. Que o senhorio não perca a vontade de alugar a casa por mais 1 ano. Que o namorado deixe de gostar. Que os amigos deixem de gostar. Que o bar favorito feche. Que as noites de quinta, sexta e sábado acabem.

As pessoas têm medo da mudança. Do novo, do desconhecido, do por-viver. Querem estabilidade, querem assentar, comprar casa, carro, TV por assinatura. Querem pagar com cartão para poderem compromissar alguma coisa. Querem uma aliança no dedo, um amor na cama e no coração. Durante todo o tempo, o tempo todo.


As pessoas, hoje em dia, têm medo da mudança. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem.

02/04/2013

Coisas, Brasiles, Tugas, Amigos, Coisas

Perdi-me no tempo. Tenho andado meia perdida no tempo.

Não sei onde ficou o meu dom de escrever a toda a hora. A vontade até que ainda existe mas fica mascarada entre a preguiça de fazer login. Não sei bem quando ou como foi que cresci. Que me tornei nesta criança crescida que já não perde tempo em diários inúteis.

Inúteis, essa é de facto a verdade. Decidi aderir ao novo acordo ortográfico, foi um acontecimento meio recente. No entanto não o quero fazer aqui. Não sei, não me parece bem.

Fico agora meio perdida nestas páginas. Visito-as todos os dias, mais numa de recordação, de gozação, até. Gosto de me rir de mim própria, do quão ridícula fui por vezes.

Deixei de estar apaixonada, foi outra coisa que mudou. Nunca me tinha encontrado sem um amorzinho no coração até aos dias de hoje. Na maior parte das vezes sabe bem, deixa-me com tempo para me entreter com os amores passageiros que se vivem com muito mais intensidade. Deixa-me tempo para chorar por coisas pequenas que de outra forma não notaria. Deixa-me tempo para ser-me, descobrir-me, refazer-me. Ao mesmo tempo, esta estúpida sociedade irrita-me a paciência. Na verdade, talvez não seja bem a culpa da sociedade. Talvez seja mesmo eu que fico nervosinha. Impaciente. Carente. Desejosa. Não sei.

Quanto mais tento me conhecer, mais me desconheço. Acho que é disso que se trata a exploração afinal. Tenho ainda saudades dele. Claro. Claro. Deixei de pensar com tanta frequência. Em qualquer coisa, na verdade. Deixei de pensar na maioria das coisas do coração. Deixei que ele se deixasse estar, tirasse umas férias depois desses anos loucos pelos que passou. Acho que merece.

Mas as saudades. Se há coisa de que o meu coração não pára de se queixar é das saudades. Essa palavra ganhou uma nova vida quando aterrei aqui este ano, depois de um Natal aquecido por eletricidade. Tenho saudades de muitos e muitas coisas. Mas acima de tudo, de muitos.

De um muito em especial. Ou talvez dois em especial.

Tenho coisas a fazer. Tenho uma cadelinha nova. Chamei-lhe Tuga, porque poderei sempre dizer que na minha casa só vivem Tugas. Achei engraçado e acho que ela também. Faz cocó no sítio errado, e xixi também. Mas gosto dela. Gosto, na verdade, muito dela.

O Brasil é um lugar que me deixa feliz. Não sei. Ainda não entendi bem o porquê. Há vários porquês, na realidade. Vários vários. Muitos muitos.

Continuo com saudades. , sabes? Quando leio isto lembro-me da pessoa que eras comigo e que desvaneceu naquela manhã. Foste embora. Fui eu que fisicamente entrei naquele avião para Bruxelas, mas no fundo foste tu que foste embora. Não te encontro mais. Nunca mais. Sei que não vou nunca mais te encontrar. Não fisicamente. Se bem que fisicamente talvez também nunca mais te verei. É só triste, entendes? Só triste.